terça-feira, 16 de maio de 2017

"Até namorava contigo"



Certo dia... estava a jantar com dois amigos e a nossa conversa foi revisitar o capítulo que falava sobre nós estarmos solteiros

Essas passagens, para mim, tinham tanto de aborrecidas como de imprevisíveis. Sabia sempre o que vinha a seguir, mas podíamos terminar em lamentos ou em festejos. Um de nós podia estar perfeitamente feliz assim, enquanto outro podia ver-se perdidamente triste por não estar numa relação. 

Mas dessa vez houve uma frase que nos levou a uma profunda discussão, que espero não replicar. 

"Eu até namorava com ele." - disse-nos.

"Até? No sentido de que te submetias a isso? Como quem seria capaz de ir até aí só porque tem de ser?" - perguntámos. 

E daí veio então uma infinita desconstrução dos problemas mais ou menos sérios que podiam vir de um "até o fazia".  

Só concordámos que essa afirmação estava mesmo ligada a uma certa pressão para que tenhamos uma vida a dois. Mas nos nossos e em tantos casos não nos parecia muito aceitável essa ditadura do 1+1

Fazíamos outras contas. E o resultado nem sempre era 2. Variava muito, porque se tratava de uma ciência pouco exacta. 

E continuando com a matemática, já perdi as contas aos números de vezes em que alguém chegou e perguntou "Então JÁ namoras?", calcando novamente aquela obrigação de o fazer.

Muitas vezes respondo mas nem desenvolvo. Primeiro porque posso de facto estar numa relação e não ter que a declarar num género de actualização no perfil do facebook. E depois porque essa questão traz sempre muitos pressupostos que me chateiam. 

Tens uma certa idade. Tens isto, tens aquilo. Devias ter mais juízo. É porque tens medo. É porque sofreste no passado. É porque está na hora. É porque sabe-se lá porquê. 

E até é engraçado observar as razões que te apontam, quanto tu nem sabes exactamente justificar o quereres estar assim.

Mas isso de querer mesmo começar algo, a sério, não deve vir do teu íntimo? Não é um sentimento qualquer que deve despoletar isso? Ou é realmente um "até" baseado numa frágil regra social que deve levar-te ao refúgio em qualquer coisa só porque tens que entrar numa determinada normalidade formatada?

Será que a maioria das pessoas sabe que é possível ser-se feliz sozinho? 

Seriamente, às vezes coloco essa pergunta à minha frente e acabo sempre a rir de mim próprio e dos outros, porque parece-me demasiado rebuscado imaginar que uma maioria não chegou nunca a perceber tudo o que de bom há em viveres só contigo, embora isso possa ser mesmo efémero, como um ano, um mês, uma semana, umas horas. 

E isso pode até ser uma viagem, um descobrir de um lugar onde vais tu e onde aprendes algo novo, nem que seja que os teus pensamentos, ausentes dos ruídos e rumores de outras vozes, podem mesmo ser teus bons e fiéis companheiros. 

Basta que seja só o tempo suficiente para pelo menos descobrires que jamais deves deixar que o medo da solidão te guie por onde não deves ir. 

No fundo é básico. Cada um deve é estar como se sentir bem. E o resto são só aborrecidas contas que não resolvem problemas. 


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